sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

ESTUDAR TEOLOGIA É DEVER DE TODO CRENTE!


Não é tarefa dura lermos sobre os teólogos do passado e avaliarmos suas condutas, convicções, ousadia ou covardia diante dos desafios culturais de seu tempo. O difícil é avaliarmos a nossa conduta, a nossa coragem ou covardia em nosso tempo! De nada adiantará estudarmos Teologia se esta não for útil para nos levar a discernir a nossa época, se não nos ajudar a dar respostas as indagações existenciais da nossa alma e levar a nossa igreja a maturidade cristã! Teologia deve ser algo que nos prepara para viver e morrer!


O nosso tempo é caracterizado por uma cultura do sentimento, do prazer pessoal, do politicamente correto, que é a pós-modernidade. O próprio nome já revela incoerência, “pós-modernidade”, como algo pode ser posterior a modernidade e ser vivido no presente? Contudo, não irei entrar no mérito semântico da questão, porque pouco importa em relação às reais dificuldades que este pensamento humanista representa para a igreja do século XXI.
Em seu livro Tempos Pós-modernos, Gene apresenta uma pesquisa feita nos EUA, que revelam o sentimento e o pensamento do nosso tempo em relação a verdade absoluta:

 É difícil dar testemunho da verdade a pessoas que acreditam que a verdade é relativa (Jesus funciona pra você; os cristais funcionam para ela). É duro clamar o perdão de pecados para pessoas que acreditam que, visto a moralidade ser relativa, elas não têm pecados a serem perdoados.

Segundo uma pesquisa recente[1], 66 por cento dos americanos creem que “não existe o que se possa chamar de verdade absoluta”. Entre os jovens, a porcentagem é ainda mais alta: na faixa dos 18 aos 25 anos, 72 por cento das pessoas não acreditam que existam absolutos.[2]


Se não existe verdade absoluta, não existe Deus! E se não existe Deus, não existe padrão de certo e errado!  Existem duas alternativas: 1. Deus não existe e estamos soltos, livres para pensar e estabelecer nossos critérios, nossos padrões,: 2. Ou Deus existe, mas está totalmente ausente da sua criação e por isso não se relaciona, não governa, não estabelece absolutos a serem seguidos e obedecidos!
A ausência de absoluto deu a sociedade liberdade de sentir, pensar, projetar “livremente”, tendo um comportamento totalmente relativizado. Quando existia o iluminismo o homem navegava em mar aberto confiado no frágil barco da “razão”, seu barquinho naufragou na primeira e segunda guerra mundial. Agora o homem navega em mar aberto na “canoa” dos sentimentos, do subjetivo. Só que o homem não descobriu ainda que navegou pouquíssimo e o pouco que navegou já entrou em processo de afundar totalmente nos mares da incerteza, do relativismo, do barato e transitório existencialmente!
Os evangélicos não estão fora desse quadro. Cada vez mais a teologia torna-se relativa, pragmática, materialista, ansiosa por prazer momentâneo, e antropocêntrica, atendendo as expectativas mundanas do homem! Os evangélicos já entraram na canoa da pós modernidade há muito tempo!
A igreja do século XXI está envolvida pelos efeitos da cultura pós-moderna.  A teologia da prosperidade é a maior prova de seu materialismo e antropocentrismo, o apego ao dinheiro e tudo que ele pode proporcionar em termos materiais. É uma teologia imediatista, porque crê que Deus é obrigado a atender todas as reivindicações de forma imediata. O pragmatismo é vivido através do apego exagerado  aos  projetos, programações extraordinárias, que desprezam os meios, importando apenas com o fim em si mesmo, se deu certo é bíblico! Como devemos enfrentar nosso tempo com tantos desafios diante de nós? É necessário conhecer a Escritura e retirar dela ensinos teologicamente corretos e aplica-los a vida da igreja. Esse é o propósito da Teologia Cristã, explicar as doutrinas bíblicas e aplicar a realidade da igreja. Não tem sentido uma teologia que não seja para a vida e para nos preparar para a eternidade! Não podemos tratar  questões teológicas pelo desejo do academicismo puro e simples, porém, movidos pelo amor a Escritura e o desejo sincero de glorificar a Deus! É dessa maneira que caminharemos nessa estrada pavimenta de conhecimento eterno a nós revelados pelo Senhor em sua Palavra!
É sabido que existe uma ferrenha resistência por parte de muitos cristãos sinceros ao estudo da Teologia e o desprezo para com a história da mesma.  Entendo que esse desprezo em certo sentido é justificável historicamente. A teologia é um termo que foi criado no século II da era cristã, para diferenciar a crença cristã da crença politeísta e pagã daquele tempo. O destacado cristão, Clemente de Alexandria, contrastou os seus escritos e ensinos teológicos com a mitologia dos escritores pagãos, mostrando claramente que o termo “teologia” se referia a “asserções da verdade feitas pelos cristãos acerca de Deus”, em confronto com as histórias pagãs da mitologia grega. [3] Houve um período, em que a teologia assumiu um papel puramente acadêmico, assumindo a função de uma das matérias das principais universidades europeias. Era ensinado nas faculdades de Paris, Bolonha e Oxford, as matérias: ciências, medicina e teologia. O paganismo já era assunto resolvido, ninguém discutia mais nos séculos 12 sobre a existência de vários deuses ou de um único Deus, acreditava-se na existência de um único Deus, e Ele deveria ser o Deus dos cristãos.[4] Com essa ascensão da teologia, ela foi cada vez mais abordada academicamente e não como uma matéria pratica para a igreja. Contudo, com a reforma protestante, tanto Martinho Lutero como João Calvino entenderam a necessidade de usar a teologia de forma prática. A Academia de Genebra, fundada por João Calvino em 1559, tinha como objetivo inicial oferecer aos pastores uma educação teológica voltada para as necessidades práticas do ministério da igreja. Posteriormente, os escritores protestantes atuaram dentro das academias e voltaram a teologia para a teoria e não para a prática pastoral. Isso piorou muito com o iluminismo, que combateu o ensino teológico nas academias. O teólogo liberal Schleiermacher defendeu o uso dessa disciplina nas universidades como sendo essencial.[5] O que tudo isso mostra, é que herdamos um uso puramente teórico e acadêmico da teologia, divorciada da pratica e desafios ministeriais. Temos que unir o academicismo com a prática da igreja, teoria sem prática cristã não serve para nada, a não ser para enfeitar o pescoço dos acadêmicos tolos! A resistência atual no meio evangélico se deve basicamente por essas razões históricas apresentadas.

A história bem compreendida contribui para o bom entendimento do presente e nos prepara para o futuro. A Escritura é o fundamento seguro, a verdade absoluta, o critério com o qual usamos para interpretar tudo que nos cerca.

Embora todas as igrejas tenham uma teologia, é preciso saber se tal teologia procede das Escrituras ou de experiências humanas e cosmovisão antropocêntrica. A base teológica definirá o desenvolvimento correto ou não correto da Teologia pregada na igreja. Se a base é a Escritura e somente ela, a teologia será boa, mesmo que envolvida por uma nuvem de heresia, que sempre paira em nossas reflexões, as verdades centrais serão abordadas corretamente. Todavia, se a base da teologia for as necessidades humanas, antropocêntrica, a teologia não será teologia, mas antropologia divorciada de uma visão bíblica, mas envolvida totalmente em humanismo cético.  
 A teologia é uma expressão de fé da igreja amparada nas Escrituras, como disse o teólogo Kuyper:

A Teologia não termina em conhecimento teórico e abstrato; antes, alcança plenitude no conhecimento prático e existencial de Deus, por meio da sua revelação nas Escrituras, mediante iluminação do Espírito. Conhecer a Deus é obedecer a seus mandamentos. A Teologia não pode ser um estudo sem compromisso, feito por um transeunte acadêmico. Ela é função da igreja cristã, dentro da qual estamos inseridos. “Estudamos dogmática como membros da igreja, com a consciência que temos uma incumbência dada por ela e um serviço a lhe prestar, devido a uma compulsão que pode se originar somente no seu interior.[7]

Estudar teologia é um dever de todo crente e de toda igreja cristã. É por falta de interesse pela Palavra que a igreja tem sido facilmente atacada por heresias e abraçado paganismo e misticismo. As músicas evangélicas retratam bem a fraqueza teológica prevalecente, as campanhas ou práticas evangélicas provam o quanto a Igreja de Cristo no Brasil tem sido facilmente enganada por Satanás e seus ministros.

A igreja precisa de Teologia fundamentada nas Escrituras. Não existe como ela existir sem estudar sobre Deus, sua revelação registrada de forma inspirada nas Escrituras! Qualquer pregação que não se fundamente nos ensinos escrituristicos, é falsa teologia, é antropocentrismo e não uma visão teocêntrica e cristrocentrica!

Reverendo Márcio Willian Chaveiro

[1] Era recente em 1999, quando este livro foi publicado em nossa língua. Com certeza a porcentagem daqueles que não creem na existência da verdade absoluta aumentou nos últimos anos.
[2][2] VEITH, Gene Edward Veith, Tempos Pós-modernos, Editora Cultura Cristã, 1999, p.10
[3] MACGRATH, Alister E. Macgranth, Teologia Histórica – Uma Introdução ao Pensamento Cristão, Editora Cultura Cristã, 2007, p.15
[4] MACGRATH, p.16
[5] MACGRATH, p.17
[6] Fonte: http://www.monergismo.com/textos/teologia/teologia_precisa.htm
[7] COSTA, Hermisten Maia Pereira da Costa – João Calvino 500 anos, Editora Cultura Cristã - 2009– pp 81-82