Para os teólogos reformados a Escritura é
infalível, inerrante, autoritativa e única regra de fé e prática. Por 18 séculos na
história da igreja prevaleceu a opinião ortodoxa da inspiração divina. Os pais
da igreja sempre afirmaram isso, com raríssimas exceções de alguns hereges que
se levantaram questionando alguns livros como inspirados. Para os liberais e
neo-ortodoxos essa posição com relação a Escritura defendida pelos reformados é
radical e xiita, contudo, a própria Escritura testemunha com relação a sua
inspiração, crer nessa verdade é uma questão de fé, embora as evidencias de
inspiração sejam muitas tanto internas como externas nas Escrituras. Na
Escritura Deus revelou tudo o que lhe aprouve revelar para o bem dos seus
filhos.
Segundo a Confissão de Fé de Westminster,
capítulo 1, seção 10, estabelece o critério de avaliação da vida da igreja:
O Juiz Supremo, pelo qual todas as
controvérsias religiosas têm de ser determinadas, e por quem serão examinados
todos os decretos de concílios, todas as opiniões dos antigos escritores, todas
as doutrinas de homens e opiniões particulares, o Juiz Supremo, em cuja
sentença nos devemos firmar, não pode ser outro senão o Espírito Santo falando
na Escritura.
Esse é o conceito que defendemos como o
correto, conhecido como o conceito ortodoxo das Escrituras. É considerado
conceito ortodoxo aquele que aceita plenamente a definição de que a Bíblia toda
é inspirada por Deus, inerrante e infalível. Neste grupo podemos encontrar um
grande número de representantes em diferentes denominações históricas. Em
alguns casos são chamados de conservadores, fundamentalistas ou até mesmo de
evangélicos somente (principalmente no contexto americano).[1]
A
Bíblia não é um compêndio de Teologia Sistemática. É a revelação que Deus
apresenta do plano e da história da redenção e, como tal, é também o registro
histórico do que Deus tem feito e dito para realizar esse plano. O grande
teólogo holandês Kuyper afirmou:
A Teologia nunca
é “arquetípica”[2],
mas “éctipa”[3].
Ela não é gerada pelo esforço de nossa observação de Deus, mas o resultado da
revelação soberana e pessoal de Deus. Uma “teologia arquetípica” – se é que
podemos falar deste modo – pertence somente a Deus, porque só ele se conhece
perfeitamente. Por isso, a Teologia sempre será o efeito da ação reveladora,
inspiradora e iluminadora de Deus por intermédio do Espírito. A Teologia nunca
é a causa primária; sempre é o efeito da ação de Deus revelar-se. “No princípio
Deus” – isto deve ser sempre considerado em todo enfoque que dermos à
realidade. Deus se revela e se interpreta por meio do Espírito; somente por
meio dele poderemos ter genuíno conhecimento de Deus. A Teologia sempre é
relativa: “Relativa à revelação de Deus. Esse precede e o homem acompanha.”[4]
A
Teologia sempre será serva da Escritura e não o contrário! A teologia deve ser
desenvolvida a partir da revelação, se purificando, buscando fazer o que é
correto, aplicar de forma adequada. A igreja deve ser edificada e levada a
glorificar a Deus a partir da boa teologia. Teologia que não edifica a igreja e
a leva a glorificar a Deus, não foi produzida pela revelação de Deus em sua
Palavra!
A
convicção reformada sobre a Escritura é refletida nesta afirmação de Berkhof: “A Bíblia é e continuará a ser a palavra de
Deus para todas as gerações sucessivas dos homens somente em virtude de que sua
inspiração é divina. Toda a Escritura foi dada por inspiração de Deus. Isto a
torna a regra infalível de fé e prática para a humanidade.”[5]
E Loraine Boettner
acrescenta:
Nossas razões primárias por
assegurar que a Bíblia é a palavra inspirada de Deus é que os escritores
reivindicam esta inspiração, e que o conteúdo de sua mensagem está
sustentado nesta reivindicação. A
uniformidade com que os profetas insistem que a mensagem que eles falam vem não
deles próprios, mas do Senhor – que sua mensagem era a pura e genuína Voz de
Deus, falada a eles exatamente como eles tinham a recebido - é um notável
fenômeno da Escritura.[6]
Para
os ortodoxos a Escritura é infalível e consequentemente inerrante:
A inerrância é o ponto de vista que, quando todos os
fatos forem conhecidos, determinarão que a Bíblia, nos seus autógrafos
originais e corretamente interpretada, é inteiramente verdadeira, nunca falsa,
em tudo quanto afirma, quer no tocante à doutrina e ética quer no tocante às
ciências sociais, físicas ou biológicas[7]
O fato dos reformados crerem na suficiência
das Escrituras, tendo-a como única regra de fé e prática, não significa que o
conhecimento secular é desprezado ou que entendemos que a Bíblia fale sobre
tudo. Significa que a Bíblia nos instrui a influenciar a cultura, a sociedade,
para glorificar a Deus! Michael Horton esclarece:
Os reformadores
insistiram que a Escritura não somente tem a última palavra, como é também o
princípio formal de tudo o que cremos sobre a doutrina e conduta. Isto é, ela
delineia e forma nossa fé. Não significa simplesmente desconsiderar
essencialmente as definições seculares da realidade emprestadas da psicologia,
do comércio, da sociologia, da política e dos setores correlatos. Antes, é mais
provavelmente subverter nossas pressuposições. Nesse aspecto, os reformadores
distinguiam entre “coisas celestiais” e “coisas terrenas”. No âmbito destas
últimas, inclusive ciência, arte e filosofia, os descrentes podiam contribuir
para o avanço do conhecimento e da experiência. Afinal, a Escritura não está
interessada em dizer-nos todas as coisas sobre tudo, e o mundo de Deus está
aberto à investigação de todos. Mas as realidades transcendentes do caráter de
Deus, suas ordens e sua obra salvadora, não estão disponíveis ao filosofo,
cientista, artista ou terapeuta. A sabedoria secular pode nos levar à verdade
sobre a revolução dos planetas mas não pode explicar a natureza de Deus, o eu,
a culpa e a redenção. Ela não pode nos levar à verdade acerca de como somos
salvos da ira de Deus, pois recusa-se a crer que isso seja sequer uma realidade
para início de conversa. “A palavra da cruz é loucura para os que se perdem”,
disse o apostolo Paulo, porque ela não se amolda às perguntas – muito menos às
respostas - da sabedoria secular.[8]
Por ser a verdade de Deus para nós,
reformados, a Bíblia deve ser pregada com toda a ousadia e poder do Espírito
Santo. Todo pregador deve ter diante de seus olhos ao pregar, a glória de Deus:
Nossa adoração é fraca porque nossos conhecimentos de Deus são
fracos, e nossos conhecimentos de Deus são fracos porque a nossa pregação é
fraca. Quando, porém, a Palavra de Deus é exposta na sua plenitude e a
congregação começa a ter um vislumbre da glória do Deus vivo, todos se curvam
em reverente temor solene e admiração jubilosa diante do seu trono. É a
pregação que realiza isso – a proclamação da Palavra de Deus no poder do
Espírito de Deus. É por isso que a pregação é incomparável e insubstituível.[9]
Concluo essa parte com a declaração
edificante de Strong sobre a infalibilidade das Escrituras:
...a Bíblia é infalível no sentido
de que qualquer que se rende num espírito dócil aos seus ensinos não cairá no
doloroso erro em matéria de fé e caridade. Melhor do que tudo, encontrará nela
o segredo de uma nova, santa e abençoada vida ‘escondida com Cristo em Deus
(Cl. 3.3). As Escrituras testemunham de Cristo…Através delas ele
verdadeiramente e adequadamente se faz conhecido a nós.[10]
Reverendo Márcio Willian Chaveiro
[1] MEISTER, Mauro
Meister – Panorama da Teologia Bíblica, apostila não publicada – p. 04
[3] Ectipica é o reflexo do arquétipo, do modelo, cópia do modelo. Os
homens desenvolvem uma copia da teologia de Deus, muitas vezes completamente
oposta a ela. Para ser uma cópia verdadeira depende da revelação, Escritura.
[4] Citado por HERMINSTEN MAIA, João Calvino 500 anos, Editora
Cristã, 2009, p.81
[5] BERKHOF, Louis Berkhof, Manual
de Doutrina Cristã, Ed. Ceibel,
Patrocínio - MG, 1992, pp. 40-41.
[6]
Loraine Boettner, Studies in Theology, The
Presbiterian And Reformed Publishing Company, Phillipsburg, New Jersey, 1985.
p.15.
[7] ELWELL,
Walter A.Elwell, Enciclopédia
Histórico-Teológica da Igreja Cristã, vol.II Ed. Vida Nova, São Paulo-SP,
1988, p. 180.
[10] STRONG, Augustus
Hopkins Strong, Teologia Sistemática, Vol.
I, Ed. Teológica Ltda, São Paulo –SP, 2002, p. 301.
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