sexta-feira, 20 de junho de 2014

RESENHA DO LIVRO: ECLIPSE DA ALMA


 Eclipse da Alma - Vários (8563607022)



MÁSPOLI, Antônio A. G. (Org.) – Eclipse da Alma: edição século 21. São Paulo: Fonte Editorial 2010.

Introdução
O livro Eclipse da Alma organizado pelo Dr. Antônio Máspoli é um excelente livro para aqueles que se interessam por conhecer mais sobre as doenças psicossomáticas. É um livro que é produto de uma competente equipe de especialistas nas doenças da mente, tais como: Dr. Pérsio Ribeiro de Deus – Drª. Patrícia Pazinato – Drª. Dâmaris Cristina de Araújo Malta.
Progressivamente a quantidade de pessoas com doenças psicossomáticas aumenta, tornando uma tarefa árdua para os pastores que precisam de livros como este para auxiliar na interpretação dessas doenças e saber para quem deve ser encaminhados alguns casos.
Passaremos para os pontos principais do livro, apontando apenas as que nos chamou mais atenção e faremos considerações criticas a respeito do mesmo, na intenção de tornar mais interessante a avaliação e consideração sobre o mesmo.
1.  A Psiquiatria e a Religião
Esse assunto é tratado com bastante propriedade pelo Dr. Pérsio Ribeiro de Deus, onde ele apresenta as interpretações provindas da religião com relação as doenças da mente. Embora ele demonstre os conceitos errados da religião, considera esse meio como campo  terapêutico para aquele que se encontra doente na sua psiquê.
            Concordamos com o Dr. Pérsio que a religião primitiva e ainda alguns círculos atuais interpretam depressão como sendo puramente influência demoníaca. Contudo, no desenvolvimento do raciocínio do singular escritor, demonstra uma falta de compreensão bíblica teológica com relação alguns efeitos da Queda na mente humana e a possibilidade de alguns casos serem realmente causados por pecado ou até mesmo possessão demoníaca. No caso citado por ele, que é Davi, a causa da depressão era sem duvida algum pecado não confessado, como o próprio declara no Salmo 32.4: “Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em sequidão de estio.”
            Para comprovar a nossa observação, o Dr. Pérsio mais adiante referindo-se ao rei Saul, faz a seguinte análise:
“Sob a leitura da psiquiatria atual, Saul se enquadra perfeitamente num distúrbio psíquico denominado Transtorno Afetivo Bipolar. Nesta doença, há uma alternativa entre períodos de euforia e de grande coragem e períodos de profunda  depressão, inclusive com a presença de delírios de perseguição. Seus criados, entretanto, interpretaram sua alteração psíquica como um espírito mau da parte do Senhor. Por tudo que foi exposto até o momento, a interpretação dos criados era perfeitamente compreensível à época, pois acreditava-se então que Iavé os punia com catástrofes, doenças e sofrimentos, para que retornassem ao caminho do Senhor.”[1]
            Fica claro que o Dr. Pérsio é um excelente psiquiatra, compreende todo o mecanismo psíquico de uma pessoa, no ponto de vista médico. Contudo, ao usar o conhecimento médico para interpretar comportamentos de homens narrados nas Escrituras, comete alguns deslizes teológicos. Quando diz que “Sob a psiquiatria atual, Saul...” Demonstra que toda a sua análise de Saul parte da psiquiatria e não de uma compreensão exegética do texto. Depois afirma na referida citação: “...Seus criados, entretanto, interpretaram sua alteração psíquica como um espírito mau da parte do Senhor...” Indica que seus pressupostos teológicos consciente e inconscientemente defende que os relatos bíblicos são frutos de uma religião, e não a religião judaica fruto das Escrituras. Toda narrativa deve ser interpretada a luz de outras passagens. Sendo assim, Saul foi um homem com neuroses de perseguição, nesse ponto a avaliação esta correta, mas em determinados momentos foi oprimido por espíritos malignos que potencializaram esses pecados e distorções em sua alma.
            É importante esclarecermos que essa avaliação deprecia apenas a questão de interpretações bíblicas equivocadas por parte do autor e não a questão de avaliação médica. Ele é um especialista e não ousamos discutir área que não nossa competência . Ele mostra com propriedade as concepções erradas de muitos cristãos acerca da depressão, onde os quais atribuem tudo ao pecado, demônios ou punições de Deus. É preciso interpretar os fatos a partir de uma análise bíblica equilibrada e exegética, não desprezando os recursos médicos dados por Deus. Por isso a abordagem do Dr. Pérsio é importante e vem para somar no conhecimento do conselheiro cristão.
2.  A Doença Depressiva sob a ótica da Psiquiatria
            O autor expõe o aumento de depressivos no mundo, o que deve nos alertar. Sendo a doença do século. Em poucos anos será a principal doença no mundo. O que exige dos pastores uma condição cada vez maior de tratar esses problemas.
            O Dr. Pérsio demonstra com clareza que para a neurociências a depressão é uma desordem do funcionamento cerebral, que afeta e compromete o funcionamento normal do organismo, com reflexos ou consequências na vida pessoa em seus aspectos emocionas ou psicológicos, familiares e sociais. Ele ainda afirma: “A doença depressiva deve, portanto, ser examinada sob o ponto de vista biológico, genético, cognitivo, social, considerando ainda a história pessoal, econômica e espiritual.”[2]
            A pergunta que fazemos é se tal conceito que toda depressão é de fundo biológico, genético, cognitivo, social, não estaria o autor caindo no mesmo erro de Jay Adams que é denunciado anteriormente[3] como que atribuindo toda depressão a problemas pecaminosos? É necessário buscar o equilíbrio desta concepção entre os dois extremos.
            O Dr. Pérsio conclui seus argumentos neste capítulo afirmando que o tempo atual é conhecido como “década do cérebro”[4].
3. Angústia, Fé e Sentido da Vida na Pós-Modernidade
            O Drª. Dâmaris Cristina explica que a depressão pode ser um resultado desta interação do homem com o mundo, que muitas vezes lhe é inóspito. Pode ser a manifestação da escolha inautêntica do Ser.[5]        
Adiante a autora coloca que o homem se angustia com a possibilidade de ser ou não ser:
“O Homem vê-se mergulhado em angústia diante desta dimensão de Ser, frente à possibilidade de não Ser ou pelo temor ao seu Vir a Ser, por não conhecê-lo ou pela incerteza de não concretizá-lo. Sente-se incapaz de viver em liberdade de escolhas; teme escolher, principalmente optar por seu modo mais próprio de viver no mundo, de forma angustiada, mas preenchida de sentido e de incertezas.”[6]
            O homem só poderá contemplar sua existência mediada por relações a partir do outro e com os outros, explica a Drª Dâmaris.[7] Mas a sociedade com sua visão narcisista e materialista atrapalha esse processo de aprendizagem a partir do outro ou dos outros.
            4. A Depressão no Contexto da Psicologia de Carl Gustav Jung, da Religião e do Aconselhamento Pastoral Solidário
            O Dr. Máspoli vai introduzir seu assunto a partir de considerações sobre as várias visões religiosas de enfermidade, algo semelhante ao que fez o Dr. Pérsio. Ele aborda mais o aspecto da expiação como sendo um meio nas religiões antigas de expiar a culpa, tendo sempre Xamãs que detêm os poderes sobrenaturais para curar as enfermidades, o que precisamos em muitas igrejas evangélicas.
            Ele abordará a força da culpa nas culturas religiosas. A visão em muitos meios religiosos é que a causa das enfermidades é sempre a culpa. Essa visão causou uma grande quantidade de cerimônias de sacrifícios expiatórios.
            O autor denúncia a incompreensão de muitas igrejas evangélicas que têm no seu meio, pessoas histéricas, epiléticas e esquizofrênicas... que são tidas sempre como endemoniadas.[8] Essa prática visão ocorre muito no meio pentecostal e neo-pentecostal.
            É enfático a posição do Dr. Máspoli que as compreensões religiosas do passado e muitas do presente são equivocadas com relação as doenças da mente. Concordamos com ele, que o desenvolvimento, até mesmo científico, é recente e que por muito tempo houve uma ignorância tanto religiosa quanto cientifica. Mas o autor corre o risco de passar a ideia que no campo religioso existe uma plena ignorância de como lidar devidamente com o assunto. É lógico que no campo da medicina nem um pastor com formação teológica tem condições de avaliar corretamente questões biológicas, mas não teria como harmonizar as duas partes, médicos e pastores?
            O Dr. Máspoli é muito feliz na explicação com relação ao significado didático dos sacrifícios em Israel, como ordenanças de Jeová.[9] Mostrando que o ritual do sacrifício estimulava a pessoa a pensar sobre o sentido da falta cometida.
            Ele declara que: “Na medida em que o equilíbrio emocional se estabelece o equilíbrio espiritual se restabelece.” [10]Não seria o contrário? Qual tem primazia no nosso ser?
            Existe uma frase do Dr. Máspoli que é fantástica: “A Depressão é a imperfeição no amor.”[11] O deprimido sofre por falta de amor. Diríamos que por vezes se ama tanto que cai em depressão, sendo uma distorção do amor próprio, que busca a auto-destruição. Ele diz mais a frente: “O amor nos abandona de tempos em tempos e nós abandonamos o amor.”[12]
            O autor apresenta algumas características clássicas do depressivo, como: “...Ele (depressivo) e a cama são irmãos siameses...”[13];A depressão esparrama a concentração e fragiliza a vontade...”[14]; “A depressão geralmente leva a gula...”[15].
            Para concluir, são colocados alguns princípios fundamentais para a compreensão da depressão: a) As pessoas adoecem, sofrem e se deprimem por que são humanas;[16] b) A depressão deve ser compreendida numa perspectiva bíblica holística: Quando o homem adoece seu corpo, sua mente e seu espírito também sofrem;[17] c) Nada nos pode separar do amor de Deus[18]; d) A graça de Deus como base para a saúde humana e uma possível superação da depressão[19]; e)  O perdão incondicional de Deus como suporte para a mente do deprimido[20].
            Opinião:
            O livro tem relevância para todo conselheiro que deseja aprender mais sobre o mecanismo da mente humana. São especialistas na área medica com extrema experiência que lançam luzes para essa área tão carente de bons materiais.
            A leitura é agradável, com exceção de partes mais técnicas que para leigos em psiquiatria torna-se enfadonho, todavia, são poucas partes nesse caráter. Na maior parte do material é didático e exemplificado pelos autores.
            Todo cristão e especialmente os pastores devem ler esse livro. Ajudará bastante na compreensão de muitos aspectos relacionados as doenças da mente. Portanto, recomendamos para ser lido por cristãos com dificuldade de compreensão nesta área e para pastores conselheiros.
            Todavia, quando tocam em questões teológicas e bíblicas, cometem erros por não ser a área de atuação deles. Embora, o Dr. Maspoli seja pastor, sua atividade de maior dedicação é a psiquiatria e não a teologia. As recomendações são para as áreas de competências dos autores e não em outras tocadas pelos mesmos!
           
           Reverendo Márcio Willian Chaveiro





[1] DEUS, p. 30
[2] DEUS, P. R., p. 60
[3] DEUS, P. R., pp. 42-43
[4] p.88
[5] CRISTINA, p.97
[6] p.98
[7] p.102
[8] Máspoli, p.134
[9] pp. 140-150
[10] p.148
[11] p.156
[12] p. 158
[13] P.160
[14] P.160
[15] P.160
[16] P. 214
[17] P.217
[18] P.219
[19] P.223
[20] P. 224

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